O que ensina o latim...

"Quod non est in actis, non est in mundo" ("O que não está escrito, não existe")

sábado, 30 de março de 2013

A nossa vizinhança

Enquanto escrevia a minha última publicação, dei por mim a pensar sobre qual seria a nossa vizinhança, a blogosfera económica portuguesa. Fiquei curioso, porque normalmente quando alguém publica um texto como aquele, ele costuma rodar pela blogosfera para encontrarem os erros e melhorá-lo.

Por exemplo, quando Bryan Caplan avançou com o seguinte problema ao público, the toothpick problem:
Suppose half of the sectors of the economy grow forever at 4%, while the rest completely stagnate. I'm strongly tempted to say that this economy's growth rate equals 2% forever. Anyone tempted to disagree? If so, why?
Ele recebeu recebeu várias respostas, propôs a sua, mas a pergunta finalmente recebeu a resposta que merecia, na minha opinião, pelo cunho de Brad DeLong: depende das elasticidades da procura.

Voltando ao tópico deste artigo. Conhecia apenas um par de blogues portugueses dedicados à economia, mas tirando proveito da lista de blogues que costumam divulgar no blogroll consegui encontrar bastantes. Mas vários encontravam-se inactivos, dedicavam-se sobretudo ao comentário político ou então não contribuíam muito para o assunto.

De todos, seleccionei os seguintes:
Começo por aquele que parece ser o mais conhecido da lista. Este blogue está associado ao Jornal de Negócios, sendo os seus autores de facto jornalistas no mesmo. Por vezes funciona como um agregador, publicando mensagens apontando os principais artigos sobre um tópico.

Este blogue é da exclusiva autoria da Helena Garrido, directora-adjunta do Jornal de Negócios. As publicações são um tanto esporádicas.

O seu autor é um professor da FEP, Pedro Cosme Vieira. Tirando o seu facto de eu dificilmente concordar com muito do que ele diz, ele tem o incrível hábito de anexar sempre uma foto de uma desnuda às suas publicações. Vá se lá saber porquê. Talvez o erotismo e a economia têm mais em comum do que eu desconfio.

Momentos Económicos... e não só é o nome completo do blogue. Quem o escreve é Pedro Pita Barros,  professor na FE-UNL, e é bastante prolífico. Se não me engano, a sua área de especialização é a Economia da Saúde, mas ele escreve um pouco sobre tudo.

À semelhança da Massa Monetária e deste vosso blogue, os Ladrões de Bicicletas é escrito por uma equipa de autores. Na lista de autores, reconheço o nome do João Galamba, economista e deputado pelo PS. A sua equipa faz questão de dar uso ao blogue, como se testemunha pela torrente de artigos, e escreve com afinco sobre sociedade, política e economia.

De todos os blogues, este devia ser o mais interessante só pelo mero facto de quem são os seus autores: Ricardo Reis, Pedro Pita Barros e Trigo Pereira entre muitos outros. Mas as publicações são escassas, pelo que julgando pelo seu potencial este é o mais despontante. Contudo, costuma ter comentários relevantes e perspicazes.
Uma particularidade deste blogue, é que, mesmo sendo dedicado à economia portuguesa, os autores escrevem em inglês.

E por aqui fica o meu levantamento sobre a blogosfera económica (ecosfera?) portuguesa.

Se conheces mais algum um blogue económico e português que não figure nesta lista, partilha-o connosco nos comentários.

sexta-feira, 29 de março de 2013

Baleias de regime

Na quarta-feira pela fresquinha estava a ouvir a Antena 1 quando me entrou pelo pequeno-almoço dentro a crônica diária dum tal Gobern.
Para quem não conhece a peça, melhor será informar-se antes de ler isto.


De partida, nada tenho contra indivíduos pesados, feios e pouco apresentáveis, mas sim contra seres pouco profissionais, oportunistas e arrogantes: não perde chance para se promover, usa e abusa da antena para debitar sentenças e é insuportavelmente convencido. Tudo isto a figura o é.

Começou nos comentários às coisas da bola na RTP, depois entregaram-lhe um programa de 2 horas aos sábados na Antena 1, já mais recentemente enfiaram-no noutro programa de futebol onde é pago a uns bons milhares de € para mandar bitaites com outros dois sortudos na RTP. E agora virou emplastro com uma crónica livre nas manhãs da rádio pública, onde também fala eternidades. O sr. tem um tacho bem simpático para a inutilidade das coisas que diz.
O que se segue? Um lugarzinho aos domingos na RTP lado-a-lado com o aldrabão farmacêutico?

É nestes tipos carreiristas que estamos a enterrar os nossos impostos. Será para este “serviço público” que serve a comunicação social do Estado?
Se é, as baleias que vão fazer regime para outras águas. Nas minhas não cabem!
E de caminho podem levar a RTP com elas: não parece fazer grande falta e a ração de que se alimenta poderia ser dada a animais de menor porte.

(História esta que se segue a outra já contada com igual craveira de produtividade pública)

quarta-feira, 27 de março de 2013

Estado canídeo


Este Estado judicialista, litigante, despesista e paralisante condenou-me a pagar 55€ por me ter feito acompanhar dum "animal canídeo" numa esplanada de praia vazia na Caparica fora da época balnear em Outubro.

A sentença veio anexada de um parecer de 4 páginas, que chamá-lo redundante é um elogio: cheio de expressões para “encher chouriços”, repetições e contradições (ora diz que estava na esplanada, ora diz que estava na praia). Coisa valiosíssima pela qual vou pagar uns adicionais 15€ (deve ter dado uma tarde inteira sem pausas para café ao imbecil que a escreveu).
O cão em questão (ou "canídeo", segundo o novo acordo ortográfico) é o ser mais pacífico e obediente que se possa encontrar. Goldan Retriever, com experiência de trabalho junto de deficientes cognitivos. Pode-se-lhe enfiar a mão pela goela abaixo que ele acha normalíssimo. Nunca ladra. Quando vai à praia não sai do guarda-sol e não gosta de mar. E quando faz as suas necessidades, vai esconder-se na moita para não o verem.

Pergunta: a polícia marítima não tem mesmo mais nada para fazer? É destes burocratas que precisamos?
Depois venham-me dizer que não há funcionários públicos a mais e que a produtividade na Administração é elevadíssima.

terça-feira, 26 de março de 2013

As consequências do leilão da DECO


Ontem escrevi sobre os efeitos que espero que venham do leilão sobre o mercado mudando o comportamento dos consumidores: estes procuram o preço melhor com mais frequência e com maior sucesso, portanto exercendo força como um peso nos preços.

Hoje venho complementar essa análise com a estrutura de mercado, e portanto ver o impacto do leilão no mercado como um todo. Mas antes disso, deixem-me deixar claro que eu não conheço o mercado da electricidade de nenhuma forma em particular. Não sei como é regulado, como funciona, todos os concorrentes, a os custos, etc. Mas avanço, porque mesmo não sabendo, desconfio de alguns aspectos.

Adiante. Eis como vejo esse mercado (de consumo doméstico): a EDP detém o monopólio da produção, mas o mercado tem uma franja competitiva (Endesa, Iberdrola e Fenosa). A franja tem todo o interesse em crescer para ganharem escala e apossarem-se de parte do lucro da EDP, a EDP tem tudo o interesse que as pequenas continuem pequenas, para que não magoem os lucros da EDP. É esta a dinâmica que justifica o sucesso do leilão do lado da oferta.

Mas agora reparem, o mercado é um monopólio. Pode ter outros concorrentes, mas é essencialmente um monopólio, porque a EDP tem poder de mercado, é capaz de definir preços. E como qualquer aluno de Microeconomia sabe: com discriminação de preços, um monopólio é capaz de aumentar os seus lucros ainda mais. Se o produtor é capaz de identificar quanto cada um de nós está disposto, o chamado preço de reserva, ele pode comprar esse preço e portanto extrair todo o excelente do consumidor, aumentando o seu lucro.

E, o que o leilão acabou de fazer foi mesmo isso! A DECO acabou de criar um mecanismo que separa aqueles que estão dispostos a pagar mais pela electricidade que os outros. Este leilão acaba por separar aqueles que se dão ao trabalho de procurar preços mais baixos e têm informação, daqueles que não têm informação, são desconfiados da mudança e não se dão ao trabalho de procurar melhores preços, e portanto pagam mais como consequência.


Na prática passamos de ter um mercado de electricidade, para dois, porque o produtor é capaz de discernir os consumidores agora: um para os preguiçosos e outro para os pesquisadores. No primeiro caso temos uma curva da procura muito inelástica, e no segundo uma mais elástica.

Naturalmente, como a estrutura de custos é a mesma, mas a elasticidade da procura é inferior no primeiro caso, o preço será superior no mercado dos preguiçosos do que no mercado dos pesquisadores.


Portanto, uma consequência deste leilão seria o aumento do preço para aqueles que não aderiram ao leilão, caso não houvesse um regulador e se as empresas fizessem actualizações imediatas para o preço óptimo. Mas já que se admite que há rendas no sector energético, isto é, lucro excessivos então diria este regulador não faz um trabalho de primeira na defesa do consumidor.

No fim temos duas boas razões para aderir ao leilão da DECO: entrasse no mercado liberalizado a um preço menor do que seria noutro caso e evita o aumento do preço por ficar no mercado dos preguiçosos.

segunda-feira, 25 de março de 2013

O leilão de electricidade da DECO


O Público recorda-me de algo que já queria escrever há umas semanas. Hoje venho chamar a atenção para o leilão da DECO sobre a tarifa da electricidade. Este leilão vem facilitar a busca do tarifário óptimo para o consumidor, busca essa que consome tempo e é difícil de discernir, além de proporcionar o empurrão para essa mesma busca.

O principal argumento do leilão é que “juntos pagamos menos”, ou seja, quem adere procura pagar menos na tarifa da electricidade, fazendo valer o poder negocial do conjunto. Mas acredito que os resultados mais positivos resultarão da dinâmica que resultarão do leilão ao longo dos próximos anos.

Explico. Pelo que percebi do site do leilão, um utilizador regista-se junto do site e fornece dados sobre o seu consumo de electricidade. Durante o leilão, todos os fornecedores de electricidade são convidados a licitar uma tarifa mais baixa. Com os dados facultados à DECO, ela estima quanto o utilizador gastaria segundo o tarifário actual e aquele que lhe é mais vantajoso, daqueles que são licitados. O utilizador não é obrigado a aceitar o contrato resultante do leilão, mas se o aceitar o contrato tem uma duração de 12 meses.

Já agora, o leilão está aberto a novos participantes até 30 de Abril, 2 de Maio começa o leilão e a partir de 15 de Maio os participantes receberão uma mensagem com o resultado. Também é importante referir que só podem aderir casas em território continental e que a DECO é capaz de «vir a receber uma comissão por cada contrato assinado pelos consumidores junto do fornecedor que ganhar o leilão». Mas quem é membro da DECO receberá a totalidade da comissão, e nos outros casos a DECO reterá parte dessa comissão, a fim de cobrir custos administrativos.

Ou seja, como resultado directo do leilão, durante 12 meses o utilizador poupa na conta da electricidade, mas e passados esses 12 meses? O contrato termina e o fornecedor faz uma oferta. Mas o que realmente importa é que os utilizadores terão uma maior propensão a fazer uma busca ao mercado para procurar um contrato que mais lhe agrade, e também já terão experiência nessa área. Para mim, este maior cuidado com os contratos que são firmados, a busca pelo menor preço, é o principal benefício para os consumidores, pois exercerá força para que os preços subam menos ao longo do tempo.

O meu conselho é para que adiram ao leilão, porque a tarifa vencedora será quase certamente inferior à que já paga, e até porque não são obrigados a aceitar o resultado. Para participar basta dirigir-se à página web https://www.paguemenosluz.pt/ e preencher o formulário.

Actualização: o Público informa que o leilão angariou meio milhão de pessoas.

sábado, 23 de março de 2013

Propaganda Portuguesa (O que achamos que o mundo deveria saber sobre nós...)

Desde que se fala em resgate financeiro em Portugal (ou Troika, ou em Vítor Gaspar, ou no que lhe quiserem chamar) que alguns portugueses sentiram um "chamamento patriótico" que os leva a proclamar o que de bom Portugal tem. Umas vezes bem, outras completamente descabidas, ora para pedir dinheiro à Finlândia, ora para pedir dinheiro à Alemanha, lá se foram empestando as redes sociais com vídeos alusivos a grandes factos e episódios que na "Ocidental Praia Lusitana" ocorreram.


Independentemente da motivação, este género de iniciativa utiliza métodos semelhantes: apresentar estatísticas e casos de sucesso. O problema é que, na maioria dos casos, as estatísticas são escassas e os casos de sucesso uma gota no oceano. A questão não se coloca pelo facto de se apresentarem estes dados, na minha opinião o lado mau destas iniciativas é serem necessárias para nos relembrarmos daquilo em que somos bons. Mas passando aos vídeos, estão abaixo agrupados em 2 categorias: os bons (com o mínimo de gosto e coerência) e os dispensáveis.

Bons Vídeos:

"From Portugal To Finland With Love!"

"Like Portugal - Portugal, o lugar para crescer!"

Ambos os vídeos apresentam factos acerca do nosso país, no primeiro caso factos positivos e negativos, dando a conhecer a realidade e a História de Portugal à Finlândia e ao Mundo. Já o segundo, não só mostra Portugal ao Mundo, mas também aos portugueses, para que se lembrem do que Portugal tem de melhor.

Dispensável:

"Ich bin ein berliner"

Esta iniciativa do ex-líder do PSD e comentador Marcelo Rebelo de Sousa é dispensável porque a interpretação dos factos apresentados faz transparecer uma ideia de subserviência à Alemanha e de como temos sido uns bons "alunos", sendo ainda uns "coitadinhos" que precisam de umas esmolas germânicas.

Após terem sido visualizados os vídeos, que mais há a dizer? Pegando nos bons exemplos, o que há a dizer é que por mais que se tente elevar o nome de Portugal no exterior, vão sempre existir idiotas a estragar tudo (ver abaixo). Não sou a favor de manifestações, não sou pessoa de ir berrar para a rua com o "povo". Não que não perceba quem lá vai e os seus motivos, mas acho que quem convoca as manifestações não tem qualquer interesse em melhorar a situação do país, mas em criar ruído a boas ideias e alguma confusão (para não falar na promoção pessoal!).



"14 th November 2012 Portugal WAR"

E para terminar, deixo mais um bom exemplo, desta feita de humor inteligente e sátira social.

 "Não, Não e Não - O que os Finlandeses Deviam Saber Acerca de Portugal"


sexta-feira, 22 de março de 2013

Água e cidadania

Ontem reparei que apesar de chover copiosamente durante horas, o sistema de rega de um terreno foi accionado na mesma. Ora, isto é apenas um exemplo pitoresco do contínuo desperdício de um recurso extremamente valioso que acontece constantemente a nível nacional. Diga-se de passagem que os aspersores pareciam estar em modo turbo.

Aparentemente, sou o único que repara nisto. Ou pelo menos sou o único que repara nisto agora. Se tivéssemos em seca já surgiam quinhentas vozes a descascar no abuso. Dito de outro modo, estamos perante uma situação típica de "esperar, ver, sofrer, lamentar".

E este desperdício tem o seu quê de paradoxal, quando estamos no século XXI. Até parece que o fulgor ambientalista das décadas de 80 e 90 nem surtiu nas gerações mais jovens, como até parece que hoje não vivemos rodeados de tecnologia capaz de resolver este problema de forma simples e eficaz.

Como cidadão, tenho dificuldade em tolerar este tipo de situações, e portanto fiz aquilo que como cidadão estava ao meu alcance: enviei um e-mail à Câmara informando-a do problema e de possíveis soluções.

A quem de direito,

Ontem à noite reparei que os jardins em frente ao Hospital de S. Bernardo (https://maps.google.pt/maps?q=Set%C3%BAbal&hl=pt-PT&ie=UTF8&ll=38.528824,-8.882014&spn=0.001278,0.002411&sll=38.528828,-8.881993&sspn=0.001278,0.002411&oq=Set&t=h&hnear=Set%C3%BAbal&z=19) eram regados por um sistema de rega automática accionados à uma da manhã.

Acontece que a essa hora já estava a chover bastante há algum tempo - umas quatro horas. Portanto, regar a essas horas e nesse dia era dispensável; pior, a rega era um desperdício de água.

Penso que os terrenos em causa são da responsabilidade da Câmara Municipal, pelo que chamo-vos a atenção para esta situação e proponho as seguintes soluções.

Não sei os pormenores do sistema, mas duvido que seja um relógio mecânico a coordenar a rega, mas sim um programa de software. Logo, com o actual sistema, a solução mais simples e barata, seria a verificação da queda de precipitação nas últimas horas antes de accionar os aspersores. Se a precipitação for superior a X nas últimas Y horas, então não se ligam os aspersores nesse dia. Creio que a informação sobre precipitação é recolhida e divulgada ao público pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera.

A solução anterior tem os seus problemas, pelo que um programa mais complexo que incluía uma previsão de precipitação para os próximos dias, uma estimativa da quantidade de água presente no solo dadas as variáveis relevantes.

Uma outra alternativa passaria pela substituição do sistema de rega, por um mais inteligente, capaz de analisar a quantidade de água disponível no solo. Mas esta solução só devia ser empregue quando for necessário substituir o sistema, como suspeito que que não seja muito melhor que a solução anterior.

Se ainda não houver uma boa resposta a este problema no mercado português, então esta é uma boa oportunidade para estimular o empreendedorismo dos estudantes e dos professores do IPS. Para resolver este desperdício de água, a Câmara pode propor um desafio/concurso à comunidade do Instituto Politécnico de Setúbal. Tantos os professores como os estudantes hão-de saber escrever o programa necessário, como também deverão saber construir o modelo matemático que optimiza a alocação da água.

Uma boa gestão dos nossos recursos hídricos é fundamental. Tanto será mais importante quando o desperdício acontecer em tempos de seca e não de inundação.
E pelo que vejo agora no Público, a ERSAR anda a estudar a gestão dos recursos hídricos em Portugal. É bom que tenhamos um interesse colectivo naquilo que nos tem para dizer. Portugal tem um sério problema na gestão dos seus recursos hídricos, e receio que só dará a devida atenção a este problema quando uma forte e prolongada seca nos atormentar.

quarta-feira, 20 de março de 2013

A reputação é um boneco


O ministro Gaspar foi apresentado à Nação como mente bem pensante, competente e respeitada entre pares nas instituições internacionais e famintos “mercados”.

Tomou posse em Junho de 2011. Ainda nesse ano, confrontado com um tal “desvio (que exigia um esforço de correcção) colossal” (que afinal não era bem assim…), não teve mais opção senão ir buscar 50% do subsídio de Natal e pegar no fundo de pensões da banca para tapar o défice.
Em 2012, já na posse de toda a ciência sobre o funcionamento da “máquina do Estado” (?), Gaspar e o seu orçamento aumentaram as taxas intermédias do IVA na restauração, entre outros, carregaram forte e feio no preço dos títulos de transporte, e congelaram pensões (o que já deixou de ser notícia). Nesse mesmo ano, a corte governante, quanto aos subsídios, em vez de os mandar às metades para funcionários públicos, afinal não houve nada para ninguém. Entalado pelo Tribunal Constitucional, foi obrigado a devolvê-los (ainda que em parte) neste 2013. 
O novo ano trouxe um aumento “enorme” nos impostos (anunciado pelo próprio com grande dose de  pompa e sadomasoquismo), principalmente no IRS (onde coube ainda um imposto extraordinário de 4%), mas também no IMI. Entre bricolage com os reformados, talhou um dos subsídios de férias/Natal, atenuado pela devolução parcial dos do ano anterior decretada pelo TC. (ver mais e mais)

No meio de tanto entusiasmo por impostos e cortes de despesa, o ministro não acertou uma única estimativa prevista. Aliás, quem se der ao trabalho de pesquisar sobre revisões das estimativas do governo, vai encontrá-las aos montes (nalguns casos o MF reviu previsões sobre estimativas feitas um mês antes…)

Segue-se o quadro das certezas ministeriais.

2011(a)
2012
2013

Prev
Exec
Dif
Prev
Exec
Dif
Prev
Prev(d)
Dif
Défice
4,60%
8,00%(b)
3,40%
4,50%
6,60%
2,10%
4,50%
5,50%
1,00%
Dívida
86,60%
107,80%(c)
21,20%
113,10%
120,50%
7,40%
122,00%
123,70%
1,70%
Crescimento
0,20%
-1,60%
-1,80%
-2,80%
-3,20%
-0,40%
-1,00%
-2,30%
-1,30%
Desemprego
10,80%
11,80%
1,00%
13,40%
16,40%
3,00%
16,40%
18,20%
1,80%
Fonte: OE dos sucessivos anos. Legenda: (a) OE elaborado pelo governo Sócrates, executado em parte pelo governo actual, (b) não considerada a receita de 6.000 M€ com fundo de pensões da banca, (c) pedido de assistência financeira à troika, (d) correcções depois do 7º exame regular da troika, Março 2013

É particularmente escandaloso o diferencial entre estimativas para o défice público, a mais “controlável” das variáveis apresentadas, visto resultar da gestão das Administrações Públicas (sob orientações do MF). E nem na dívida pública (variável relativamente previsível), o ministro tem acertado. Conclui-se que as execuções orçamentais partem de bases macroeconómicas erradas, o que depois afecta expectativas de receitas (impostos) e despesa (subsídios de desemprego, por eg.) alterando sucessivamente as metas do défice estipuladas. (mais erros)

Sendo a competência (bem patente acima), um dos grandes atributos que mantêm Gaspar como ministro, facilmente concluímos que de exigente com os seus ministros Passos Coelho tem muito pouco.
Outro dos eventuais motivos que levam Passos a manter Gaspar é o de este encarnar o corpo ideológico que o PM defende (?). Supostamente liberais. Surge-me então uma pergunta: qual é o governo liberal, "superliberal", “neoliberal”, “ultraliberal” ou lá que liberal seja, que, não só aceita, como agrava a carga fiscal, a pontos de a fixar à beira dos 40%?

O seu estilo é singular. Anuncia medidas penosas com a maior parcimónia deste mundo, nunca se irrita e demora três vezes mais tempo a falar do que qualquer outra pessoa (esgota os outros pela calma). Respeita os demais no trato e aparentemente responde a todas as perguntas que lhe colocam. Contudo, não é tanto assim – aprendeu depressa a arte (com ele mais refinada) de fugir às questões (eg. de resposta: “essa pergunta tem toda a pertinência mas neste momento não estou na posse de todos os dados para lhe responder”).

Para não falar da questão constitucional. Gaspar arrisca-se seriamente a ser o primeiro MF da história a ver o seu orçamento (parte dele) chumbado duas vezes pelo TC. Algo que demonstra um desrespeito “olímpico” pela ordem jurídica estabelecida, inaceitável no regime em que vivemos. Se isso acontecer, tem de se demitir ou ser afastado.
O pretexto último para o manter como ministro é o de gozar de reputação além-fronteiras. Sinceramente não cabe em mim uma explicação para tal facto, já que quem olhe para um quadro como o de cima não acredita estarmos perante alguém que mereça grande crédito da parte de gente inteligente (onde andam as expectativas racionais dos "mercados"?). Nada melhor que um artifício para contrapor a factos objectivos.
E como escrevem n’O Jumento, Gaspar faz de Passos “uma marioneta ridícula”, pois na realidade “é o verdadeiro número um” deste governo. Perigoso, portanto.

Estamos pois perante alguém que vive no mundo hermético dos números, que não conhece a realidade cá fora/da vida e que, pior que as anteriores, não sabe como resolver problemas (agravando-os). Haja então alguém que tire disto as ilações necessárias, sob pena de o país deitar fora todo o esforço feito e ficar apenas com a reputação dum boneco.

“Se um chimpanzé fosse ministro das Finanças, talvez a dívida aumentasse, o desemprego subisse e a recessão se agravasse. Ou seja, ninguém notava.”
(Ricardo Araújo Pereira, in Visão - artigo delicioso)

sábado, 16 de março de 2013

Ensinamentos: "Inside Trading" (e o caso da Goldman Sachs)

Ainda relacionado com o último "Ensinamento", onde abordei o conceito de especulação e a sua contextualização nos mercados financeiros, surge um outro conceito que vulgarmente é designado por "especulação" (negativamente conotado): o inside trading ("transacções internas" é o mais próximo que encontro em Português).
E o que é o inside trading, pergunta o leitor? Inside trading são (definição do Instituto Superior Politécnico de Viseu) "Transacções efectuadas com base em informação privilegiada por indivíduos detentores desse tipo de informação". Exemplificando, poderá ser a compra de acções de uma qualquer empresa feita por alguém com acesso privilegiado à empresa à qual pertencem as acções (membro da administração, funcionário, amigo de um dos anteriores, etc...). Salientar que esta prática é ILEGAL na maioria dos países, visto poder prejudicar os demais investidores, incapazes de aceder à informação na qual se baseou a transacção.

Onde entra a Goldman Sachs no meio disto tudo? Bem, estava eu a vasculhar o meu mural no facebook quando me deparo com a seguinte notícia: "Goldman Sachs investiu 1.118 milhões em dívida espanhola antes de recomendar aos clientes". Pois bem, o que estes senhores fizeram não foi inside trading, já que, sendo um banco de investimento, gerem fundos de investimento próprios, bem como fornecem informações/aconselhamento aos seus clientes (isto não considerando lobbies existentes dentro das empresas em que investem - o que já será inside trading, mas oficialmente não acontece). Assim, os senhores da Goldman Sachs compraram 1.118 milhões de dólares (algo como 860 milhões de euros) de dívida espanhola e aconselharam-na aos seus clientes. Este aconselhamento levará a que mais investidores adquiram dívida espanhola, o que levará (de acordo com as leis da oferta e procura) a um aumento do seu preço, valorizando a posição da Goldman Sachs, sem que novos eventos ocorram no mercado (por eventos leia-se medidas tomadas pelo governo espanhol ou novos dados socio-económicos publicados).

Assim, verifica-se que apesar de o inside trading ser ilegal, existem outras formas de influenciar resultados nos mercados financeiros que são perfeitamente legais. Isto leva a que se pondere o nível de ética da Goldman Sachs, já que tem sido diversas vezes acusada de colocar os seus interesses (seus = das suas transacções) acima dos interesses dos seus clientes (leia-se das suas transacções).

Nesta linha, não se admire o leitor que as agências de rating subam a "nota" portuguesa relativamente depressa (ler http://www.tvi24.iol.pt/economia---negocios/gestoras-de-fundos-fundos-rating-agencias-de-rating-pimco-divida-publica/1426146-6379.html).

segunda-feira, 11 de março de 2013

Pedro Leão, a Europa e o Euro - Parte III

De um modo representativo, o Pedro Leão mostrou na primeira parte que os mecanismos de mercado são incapazes de resolver a crise europeia, e na segunda apontou para a falta de instrumentos da política económica no nosso caso.

A terceira parte não foi apresentada na conferência por falta de tempo, mas o professor cedeu-me a apresentação. A ideia que ficou por apresentar é em muito semelhante à que leccionou numa das minhas cadeiras optativas. Apresento-a agora aqui.

Comecemos por analisar mais uma vez a situação dos Estados Unidos, uma outra união monetária entre estados:
- A despesa da Administração Central (Federal), representa uns 66% de toda a despesa pública e uns 20% do PIB.

Legenda: está lá, tentem decifrar.
- E uns 66% da receita corrente do Estado é da Administração Central e uns 18% do PIB norte-americano.

Pois claro, aqui também vão ter que decifrar a legenda.

No caso europeu, tanto as receitas como as despesas da Comissão Europeia têm sido pouco  mais do 1% do PIB da União.

Agora, tenhamos atenção ao que acontece quando há uma recessão num estado em particular nos EUA. Temos uma diminuição do produto, e portanto nos impostos arrecadados, e portanto esse estado reduz a sua contribuição para o orçamento federal. Por outro lado, como há um aumento do desemprego, assistimos a um aumento na despesa com a Segurança Social, que é suportada pelo orçamento federal e não estatal. E se houver caso disso, um uso da política orçamental discricionária por parte do governo federal para ajudar esse estado em particular.

O Prof. Leão, na apresentação que me entregou, recorre a um estudo do Sachs e Sala-i-Martin (1992), em que eles estimam que por cada dólar que o produto cai num estado, há uma redução de 0,35$ pagos ao governo federal e um aumento de 0,05$ de subsídios pagos pelo governo federal. Assim, a redução do rendimento disponível é menor que seria em caso contrário, pelo que o consumo, o produto e o desemprego ressentem-se menos

O que temos aqui são transferências de um estado para outro, face a uma situação temporária, através do orçamento federal. Isto é o que nós europeus apelidamos de solidariedade no nosso discurso político. Isto não evita que haja uma recessão, nem tão-pouco a resolve, mas ajuda, e muito, a suavizar os efeitos de um choque assimétrico, o que abre margem de manobra para o uso da política monetária na Europa.
A apresentação contínua, e realça numa página uma única frase:
Passados 6-9 meses o subsídio U expira e boa parte dos desempregados começa a considerar migrar para outros Estados.
Ou seja, as transferências que ocorrem através do orçamento federal suavizam o choque, e a alta mobilidade dos trabalhadores norte-americanos resolve o resto do problema

Mas, estando nós a falar sobre o problema europeu, o Prof. Leão argumenta que a baixa mobilidade dos trabalhadores na Europa daria origem a uma situação de transferências permanentes, ao invés de temporária como ocorre nos EUA. Isto porque os trabalhadores do sul europeu têm dificuldade em migrar para o norte.

O orador dá o exemplo de Mezzogiorno em Itália, que tem sofrido altas taxas de desemprego há anos, pelo que se encontra efectivamente subsidiado pelo norte de Itália.

A apresentação termina do seguinte modo:
Federalismo na Europa => Mezzogiorno gigante no Sul Europeu

quarta-feira, 6 de março de 2013

Contas (de merceeiro) sobre a Economia Paralela

Ao ver este vídeo, fiquei algo curioso e decidi fazer algumas contas acerca da economia paralela em Portugal no decorrer do século XXI. Os dados recolhidos podem ser encontrados
no PORDATAOBEGEFPúblico, que sintetizados levam ao seguinte quadro. Referir apenas que os valores se encontram em milhões de euros e que se assume uma taxa (média ponderada) de IVA de 15%, abaixo da real, que deverá rondar os 20%.



Quanto a conclusões, uma imediata que salta à vista: em 9 dos 12 anos apresentados, as contas públicas apresentariam um saldo dentro dos limites de Maastricht (3% do PIB) e num ultrapassa-os em apenas 0,13% (2005). Do mesmo modo, 2007 apresenta um défice negativo, ou seja, um superavit das contas públicas.
Este incremento da receita fiscal tem outras implicações, nomeadamente a diminuição das necessidades de financiamento do Estado (i.e., dívida pública), visto os défices serem consideravelmente menores. Isto diminui a pressão sobre os juros e poderia ter atenuado os efeitos da crise, quiçá evitar a Troika.
Deixando os números e passando ao modo como esta "fuga" à tributação deveria ser encarada, creio que se resume facilmente numa palavra: ROUBO! "Porquê?", pode perguntar o leitor. Simples, porque o Estado mais não é que a união das vontades dos cidadãos e, portanto, é propriedade de todos e para todos. Assim (e como já disse numa outra publicação), sempre que alguém foge aos impostos, é a cada um dos restantes cidadãos e contribuintes que rouba, porque a sua fuga representará, mais tarde ou mais cedo, um aumento da carga fiscal. Deste modo, chegamos a outra conclusão: se se eliminar a Economia Paralela (ideia algo utópica, mas a sua redução é efectivamente possível), a carga fiscal baixará visto o fisco recolher mais impostos (dentro - provavelmente acima - das previsões e necessidades do governo). Não sendo suposto (por definição) o Estado ter superavits permanentes, a carga fiscal baixará para o nível efectivamente necessário, garantindo o bom funcionamento das instituições e aliviando os "bolsos" dos contribuintes.


Camino de salvación

Vai alta a maré de tristezas e condolências pela morte previsível do "comandante-presidente" Chávez. Não só na Venezuela, onde gozava de popularidade (qual o ditador que não goza dum razoável apoio social?), como tanto nesta pacata terra lusitana.
A corte Sócrates e adorados "Pino e Lino" iniciaram a moda de "estreito relacionamento" com regimes de "mão-de-ferro"/cleptocráticos. O governo Passos-Gaspar-Portas não parece desgostar da ideia e prossegue o programa das festas.
Eu não dou cobertura a ditadores. Vivos ou mortos.

A aura da santidade caiu sobre a figura de Chávez, porque morreu. Já não interessa se achava graça ao Ahmadinejad e à política anti-semita, ao Al-Assad e à política sanguinária  etc.. No fim de contas, o “Magalhães” e o petróleo deram/dão um jeitão!
Quando chegar a vez do angolano Zé Edu, hão-de aparecer dezenas a sublinhar a "profunda amizade a Portugal" da criatura. Santa hipocrisia!
Que se abram então as portas de S. Pedro para o irmão Hugo. Descanse em paz!

"Aos mortos deve-se sempre a maior das homenagens, desde que tenhamos a certeza de que estão bem mortos" (Caracala)


terça-feira, 5 de março de 2013

Pedro Leão, a Europa e o Euro - Parte II

Ora, no artigo anterior vimos que a emigração não é capaz de normalizar o desemprego pela Europa, porque enfrenta fortes bloqueios linguísticos e culturais. Qual é a resposta que o Prof. Pedro Leão propõe para este problema?

Bem, a principal causa para o aumento do desemprego em Portugal é uma acentuada quebra na procura.

Numa economia aberta, se ocorrer uma redução na procura interna, então a procura dirigida a empresas internas ressente-se, assim como as importações. Se começarmos numa situação de pleno emprego e de balança corrente nula, então no fim chegamos a uma situação de desemprego excessivo e de balança corrente positiva. Perante esta situação, um Banco Central desce a taxa de juro, de modo a estimular a procura interna e externa, através do aumento do consumo, investimento e exportações, porque a taxa de câmbio tende a descer com a taxa de juro.

Mas o BCE não vai ajustar a taxa de juro para o nível o nível adequado de um único país em particular. A taxa de juro afecta todos os países da União, e de momento a Europa corre a duas velocidades. Temos um Sul com níveis históricos de desemprego e um Norte com pleno emprego. Numa situação destas, é muito difícil ter uma política monetária eficaz.

No caso português, a nossa procura externa tem sofrido ao longo da última década e meia por duas razões:
  • a China tem competido com sectores tradicionalmente portugueses: têxteis e calçados, além das máquinas eléctricas;
  • o alargamento a leste da União, desviou investimento directo estrangeiro para essa região, que passou a competir connosco nos automóveis e também nas máquinas eléctricas.
Durante a apresentação, o Prof. afirmou que Portugal não recebe um único investimento directo estrangeiro significativo há 20 anos, o que contrasta com a Eslováquia, que recebe uns 6% do PIB em IDE há vários anos e muito dele no sector da exportação.

Caso Portugal estivesse fora da eurozona, então a sua moeda já podia depreciar. Assim já não é preciso insistir na apelidada "desvalorização interna", porque esse ajuste é feito na taxa de câmbio e não nos preços e salários internos. Com isto, os investimentos em Portugal tornam-se mais atractivos e as exportações portuguesas mais competitivas. Consequentemente, o PIB e o emprego portugueses regressariam a par e passo ao nível de pleno emprego.

Contudo, avisou, que tal como no caso da Argentina, os primeiros anos a seguir à saída do euro seriam caóticos, pelo que as coisas ficariam piores antes de melhorarem. E que tal como a Argentina, Portugal redenominaria a sua dívida em escudos, pelo que só pagaria uns 50% desta, mas que a União Europeia podia intervir e pagar a diferença por nós. Ou não.

Ele terminou com «E é por esta razão, que cada vez mais penso que Portugal devia sair do euro...»


Artigo seguinte desta série: Pedro Leão, a Europa e o Euro - Parte III

segunda-feira, 4 de março de 2013

(Ir)Responsabilidade

As eleições legislativas italianas trouxeram mais balbúrdia ao já caótico estado político-financeiro da zona Euro. Como diz o candidato pelo SPD a chanceler alemão Peer Steinbruck, Itália decidiu dar “a vitória a dois palhaços”. Só conhecendo alemães se sabe da frontalidade com que falam. Foi diplomaticamente deselegante? Sim, mas disse a verdade!
"Palhaços" de serviço (ou fora dele?)

Mas este não é longe disso tema de comédia (infelizmente). A 4ª economia da Europa corre o risco de ficar à deriva, numa espiral de instabilidade e ingovernabilidade, dando a machadada final no projecto Europeu.
Os italianos decidiram-se pelo “nem sim, nem não, antes pelo contrário”. Não deram vitória clara a ninguém (cometeram a proeza de votar diferentemente para a câmara baixa e câmara alta do parlamento). E o sr. Monti, parecendo o mais sensato e respeitável daquela corte, teve apenas 10% da votação, ou seja, arredado de ser solução (?).
“Nem o pai morre, nem a gente almoça”. Parece que estes povos do sul são pródigos nos enigmas. Não sabem o que querem, nem sequer se querem alguma coisa. Ou melhor, faço minhas as palavras de Mr. Brown no blog “Os Comediantes” e com elas termino este post(cômputo blogosférico sobre o tema)

“Quem atira a culpa pela má governação da zona Euro sobretudo para a senhora Merkel não percebe nada de nada. Há eleitorados que não podem, não devem e não merecem ser desresponsabilizados pelas escolhas de treta que fazem. E goste-se ou não dessa triste realidade, os eleitorados dos periféricos do sul são pródigos em escolhas de treta. Pior: insistem nelas. Não há remédio.”

domingo, 3 de março de 2013

Pedro Leão, a Europa e o Euro - Parte I.

Na terça-feira passada fui assistir a uma conferência em que o Pedro Leão era orador. O tema mexia com a actual crise e procurava saber se Fará Sentido uma União Monetária na Europa? Eu já tinha sido aluno do Pedro Leão há ano e meio, por isso já suspeitava a resposta, mas estava interessado em saber se havia desenvolvimentos.

Cheguei uns minutos atrasado à sala, porque a melhor maneira de apreciar uma palestra é de barriga cheia. Diga-se que aquela baguete de atum caiu mesmo bem. Quando entrei, reparei que todos os presentes foram ou são alunos do Pedro Leão, à excepção de um amigo meu - que será aluno -, e os restantes eram professores.

Ao sentar-me no meu lugar, finalmente tive oportunidade de ver o que estava projectado no quadro:
Se a UM entre os 52 Estados dos EUA funciona sem problemas há cerca de 200 anos, porque é que passados apenas 10 anos a UM entre 17 Estados da UE criou problemas que parecem não ter solução?
A pergunta era provocativa. Era como se fosse um soco no estômago do BCE e da Comissão Europeia.

Para respondê-la, o Professor começou com um exemplo de um choque assimétrico. Um choque assimétrico, neste caso, refere-se a uma diminuição (ou aumento) inesperado da procura ou oferta que afecta com diferentes magnitudes os membros de uma união.

O exemplo dado tinha como gatilho o fim da URSS em 1991. Com o fim da Guerra Fria, a corrida às armas acabou, o que causou uma queda na despesa com defesa nos Estados Unidos. Acontece que a indústria militar está concentrada apenas num par de estados norte-americanos, sendo um deles a Califórnia, e portanto temos aqui um exemplo de um choque assimétrico: a procura é reduzida drasticamente num estado em particular, enquanto o resto da União segue business as usual.

Despesa militar dos EUA (%PIB): fonte
Como consequência, a taxa de desemprego na Califórnia sobe para 10%, enquanto a média nacional rondava os 7,4%.  Mas já no ano a seguir, o desemprego na Califórnia desce para a média nacional. A razão avançada para este rápido ajuste "interno" deve-se à facilidade com que os americanos podem mudar de estado, pelo que muitos dos desempregados emigraram para estados com um desemprego menor.

Comparativamente com a Europa, a emigração desempenha um papel muito menor. Como prova disso, considere-se a seguinte estatística: 33% de todos os norte-americanos reside num estado diferente daquele em que nasceu, em contraste com os 1,5% dos europeus.

Percentagem da população residente oriunda de fora do estado (2010): fonte
A razão para a menor mobilidade da mão-de-obra europeia deve-se às barreiras linguísticas e culturais da Europa. Mas não é só isso, mas também a força com que estas barreiras hoje se fazem sentir é muito maior hoje do que durante o Estado Novo, por exemplo. Enquanto no tempo do Salazar, apesar da emigração ser praticamente ilegal, uns 1,5 milhões de portugueses emigraram para o resto da Europa desempenhar trabalhos que não requeriam fluência na(s) língua(s) do país anfitrião. Nos dias de hoje, da economia dos serviços, os trabalhos requerem uma grande fluência na língua do país do destino da emigração, pelo que é mais difícil encontrar trabalho no estrangeiro.

Portanto, a emigração não é capaz de normalizar o desemprego pela Europa.

Quais são as alternativas para o problema europeu? Isso fica para a segunda parte, que isto já vai longo.


Artigos desta série:

Ensinamentos: Especuladores, Deuses ou Diabos?

Enquanto cidadão gosto de ver outros cidadãos bem informados, enquanto economista gosto de esclarecer conceitos mal usados. Combinando as duas, temos um "ensinador" e algumas lições básicas de economia e finanças, às quais chamarei "Ensinamentos". Este primeiro "Ensinamento", como o título indica, recairá sobre o conceito de especulação, o que são e o que fazem os especuladores, bem como os seus prós e contras. Como nenhum ser é perfeito, algumas opiniões transparecerão, mas o objectivo é esclarecer mais do que opinar.

Antes de definir especulação, dizer que os mercados financeiros (em termos teóricos) são "invadidos" por 3 tipos de investidores: Especuladores, Hedgers e Arbitragistas.
  • Arbitragistas (Arbitrageurs em inglês) são aqueles que encontram discrepâncias no preço de um activo financeiro e conseguem lucrar disso sem incorrer em qualquer risco. As oportunidades de arbitragem são ínfimas e nem todos os investidores conseguem encontrá-las.
  • Hedgers (o termo português mais próximo seria "Cobertores") são investidores que pretendem cobrir o risco em activos necessários à sua actividade económica quotidiana. Por exemplo, um importador português que vende futuros de Dólares para minimizar o risco de uma desvalorização do Euro aquando do recebimento de clientes nos EUA.
  • Especuladores são todos os outros investidores que tentam ganhar dinheiro com activos financeiros, baseando-se nas suas expectativas acerca da evolução do preço dos activos financeiros. 
Agora, os especuladores são bons para a sociedade geral ou, pelo contrário, deviam ser abolidos?
Por serem em maior número que os anteriores, permitem que os Hedgers consigam encontrar no "mercado" quem tenha interesse em transaccionar com eles, permitindo a existência do "mercado". Ao investirem o seu dinheiro, estão a financiar as empresas (no caso de se tratarem de títulos de dívida ou participações em empresas) ou a gerar resultados para si mesmos e para o sector financeiro (que, quer se goste ou não, tem um papel central nas economias desenvolvidas).
No sentido oposto, podem lançar "ataques especulativos" sobre algumas empresas (caso tenham dimensão/capital para isso) o que pode originar bolhas ou mesmo falências (caso Lehman Brothers, entre outros), prejudicando a capacidade produtiva das economias. Ainda assim, um dos mais famosos "ataques especulativos" foi direccionado ao Banco de Inglaterra por George Soros, que lucrou com a sua previsão da relutância do governo britânico em alterar as taxas de juro praticadas. Este exemplo tornou-se um ponto de viragem com o reforço de proibições a "vendas a descoberto" (feitas sem posse dos títulos) e com a limitação das flutuações cambiais diárias.

Em jeito de conclusão, a especulação não é mais do que "aplicar dinheiro na economia" e embora por vezes seja distorcida, a esmagadora maioria dos especuladores são indivíduos que pretendem aplicar as suas poupanças com um pouco mais de retorno (comparativamente aos tradicionais depósitos a prazo). A especulação não é um processo demoníaco em que alguém com interesses duvidosos tenta eliminar empresas ou estados "do mapa" para seu belo prazer, mas um "jogo" de expectativas à semelhança do que se faz em casinos ou casas de apostas, embora um pouco mais racional.

sábado, 2 de março de 2013

Tudo à grande!


De certo modo, não me surpreendeu a notícia do Negócios que revela que as Forças Armadas são o único grupo profissional cujos vencimentos subiram desde que estamos sob assistência financeira externa.

Exercito, Força Aérea e Marinha (especialmente esta) gozam, a pretexto de “Abril”, de privilégios de que (arrisco a dizer) nenhum outro grupo goza. A austeridade não lhes chega, e quando se ensaia algum género de corte (tão comum em qualquer outro lado), saltam logo da capoeira os sargentos, os “capitães de Abril” e velhos generais a cacarejar.
As Forças Armadas poderiam muito bem ser mais usadas para fins civis, já que para os militares de pouco servem (Portugal não está em guerras e as missões de paz em que se participam envolvem poucos meios). Tarefas como combater incêndios (tantos há para combater), auxílio na investigação criminal (tráfico de droga, espionagem, terrorismo) ou missões humanitárias nas ex-colónias (ou mesmo militares, como na Guiné) são trabalhos necessários em que as Forças Armadas poderiam ajudar com os meios de que dispõem.
Mas não. Reivindicar a torto e a direito aumentos salariais e rosnar sobre a democracia actual é que é bom.
Assim também eu!