O que ensina o latim...

"Quod non est in actis, non est in mundo" ("O que não está escrito, não existe")

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Um bigode aos professores

Os professores do Estado realizaram ontem, dia de exame nacional de Português, um exercício geral de fuga às suas responsabilidades. Ou melhor, talvez seja grotesca a generalização, porque nem todos fugiram, uns cumpriram.
Esta foi mais uma demonstração imensa de falta de ética. Não olhando aos meios. Não só da parte dos sindicatos (habituados a exceder limites), como também de quem deveria resolver a situação (os tribunais).
Numa etapa tão decisiva para milhares de jovens, num país cujo futuro é tão incerto e cujas hipóteses de construir uma carreira profissional decente estão cada vez mais vedadas aos jovens (principalmente aos que vêm de famílias desfavorecidas), é inconcebível que meio-dúzia de ineptos sindicalistas, dizendo-se professores, montem este circo, cujo propósito único é o de lixar a vida a quem é mais frágil: os estudantes das escolas públicas. E ainda por cima, levem o patrocínio das instâncias judiciais.

Eles comem tudo e não deixam nada!

Contudo, poder-se-ia pensar que ninguém opera uma coisa destas de ânimo leve, que há razões por de trás dela. Vamos lá então às três principais:

  1. As novas regras para os funcionários públicos prevêm a passagem do horário de trabalho das 35 para as 40 horas semanais. Qualquer professor que se prese trabalha muito mais do que 40h/semana, entre aulas, corrigir testes, preparar aulas, reunir com pais e alunos. Ora, se são os próprios a dizerem-no, e mantendo as 22h ou 25h lectivas semanais, onde é que isto é assunto?
  2. O segundo motivo para tanta balbúrdia é a chamada “mobilidade especial” na função pública. Poder-se-ia argumentar que o próprio MEC veio a público anunciar que tudo será feito para não dispensar esses professores. Mesmo dando de barato que isso possa não acontecer, não faz sentido que o Estado, em reestruturação do número de funcionários públicos, discrimine positivamente os professores, não os abrangendo nessa reforma (ao contrário dos administrativos, técnicos superiores, chefias intermédias, militares, etc.)? Acresce o facto de o número de alunos inscritos nas escolas tende a ser cada vez menor, fruto da quebra na natalidade. Como é que se pode manter uma educação pública minimamente (repito minimamente) eficiente, sem que estas coisas sejam levadas em conta?
  3. O terceiro argumento claramente esmaga os outros em absurdez (dada a já absurdez dos anteriores). A defesa da escola pública, trunfo usado até ao tutano, por quem não sabe o que dizer, por quem não sabe o país onde vive. Um Estado monstruoso, uma economia decrépita, uma sociedade envelhecida, uma empresariado ignorante, uma montanha de jovens (formados) sem futuro. Achar-se o fim da “escola pública” vai longe, bem longe, de emagrecer o sistema, de adequá-lo à realidade social, económica,  política, demográfica do país e do Estado que o suporta. O slogan não pretende mais do que reforçar a retórica dos "neo-liberais" feios, porcos e maus, dos "ascistas" que não defendem os valores que Abril conquistou. Sem a mais pequena adesão ao real, numa tentativa desonrosa de defender o grupeto sindical, que faz dessa actividade modo de vida.


Mas afinal, quem é este agitador-mor? Fui à procura de resposta, mas fiquei a saber de pouco.  Nem a uma página na Wikipedia o homem tem direito.

  • Aqui diz-se, entre outras banalidades, que queria ser matemático e acabou sindicalista depois de ver uma manif de cem mil em Lisboa.
  • Henrique Raposo revela que «a sua "carreira" docente conta com 32 anos de serviço, mas, na verdade, (…) só deu aulas nos primeiros 10 anos de vida profissional». Mais à frente: «Mário Nogueira tem sido avaliado como professor: recebeu o "Bom" correspondente à classificação de 7,9 obtida no agrupamento de escolas da Pedrulha, Coimbra (CM, Dez.-2011)».
  • O próprio explicou (aqui) o feito: «Fui avaliado com base num relatório de toda a actividade desempenhada na FENPROF, acções de formação que realizei, conferências e congressos em que participei, artigos que escrevi na comunicação social, tudo». Como diz Camilo Lourenço, «Experiência de ensino? Nicles».
  • De resto, filiou-se desde muito cedo no PCP, onde hoje é do Comité Central, e desde há 2 décadas anda a papaguear na praça "em nome dos professores" e da FENPROF. Ou seja, fora a propaganda político-sindical bolchevista, Mário Nogueira não existe.
Neste preparo, Mário Nogueira é O ministro da Educação. «A cadeira do ministério vai mudando de dono, mas MárioNogueira está lá sempre». Não há nada em que ele não meta o nariz: estatuto dos professores, dos alunos, dos auxiliares, dos currículos pedagógicos, da organização das escolas, do financiamento do ensino. Tudo é “negociado” com a FENPROF. Pensava eu que os sindicatos existiam para defender assuntos laborais de uma classe. Afinal servem também para governar o país.

Para o MCE surgiam dois cenários. Primeiro, esperar que o tribunal arbitral acabasse com a palhaçada, decretando serviços mínimos, Segundo, caso o tribunal alinhasse com a tropa-fandanga, manter a data do exame e decretar a requisição civil, ou alterar a data e fazer a vontade aos sindicatos.
O Tribunal Arbitral, contra a jurisprudência de 2005 e 2007 de tribunais superiores, achou que não era indispensável cento e tal alunos realizarem exame nacional de 12º ano à sua língua materna, para muitos decisivo no acesso ao ensino superior. E, pior, um Tribunal Administrativo achou que “não era urgente” despachar o recurso do Ministério antes da greve. Quero dizer: os tribunais arbitrais que são capazes de decretar serviços mínimos (que muitas vezes são máximos) para greves de camiões de enlatados, não o são para paralisações que afectam o futuro, para além do presente, de milhares de jovens e famílias? Que casos é que um Tribunal Administrativo acha “urgente” então? Gosto desta justiça coerente e despolitizada.
Em resposta a isto, Nuno Crato foi bastante paciente. Eu não o teria sido. Mas parece que ganhou esta batalha: segundo números do próprio MCE, 80 mil alunos fizeram a prova, apesar do absentismo professoral.

Em conclusão, o tipo dos bigodes acaba de fazer um bonito serviço a quem diz defender. Não só não vai conseguir levar avante! o seu propósito (o horário será expandido, a “mobilidade especial” avançará), como está a cometer a proeza de atrapalhar a vida a milhares de famílias e ao sistema educativo em geral, tal como está a virar a opinião pública contra a própria classe (que ultimamente tem compreendido os seus problemas, como o burocrático regime de avaliação e o ter de aturar miúdos mal-criados).

Um verdadeiro bigode passado aos professores.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Desmistificando as "Swaps" - Parte II

Dando continuidade ao tema previamente iniciado, desta feita apresentarei alguns factos acerca dos contratos de "Swaps" feitos por algumas EPEs (Empresas Públicas do Estado).

De acordo com o Expresso, os contratos foram fechados por 1.000 milhões de euros (faltam os do Santander). Isto, somado a 500 milhões de desconto, leva a que o impacto orçamental seja consideravelmente mais baixo que o inicialmente anunciado. Mais, as verbas utilizadas para este pagamento não são (na totalidade) suportadas pelo OGE, mas por outros Swaps (!), estes geridos pelo IGCP e que neste momento se encontram com ganhos potenciais. A meu ver, isto só vem demonstrar que nem tudo no governo é mau e que os "tecnocratas" ainda conseguem negociar em favor de Portugal (neste caso Moreira Rato, saído da Morgan Stanley).

Assim, vêem-se respondidas algumas das questões que deixei na anterior publicação:
Como foi feita a renegociação? Baixou-se a taxa fixa, reduziram-se as maturidades, ambos, ou resolveram-se os contratos?: Parece que se renegociaram as perdas (provavelmente via taxa "swap"/fixa) e se resolveram os contratos, prevenindo um aumento das perdas.
As cláusulas "exóticas" foram assinadas por vontade dos gestores (que acharam que percebiam de mercados e produtos financeiros) ou por imposição da banca (tentando ludibriar as empresas com cláusulas que os gestores desconheciam)? Quanto aos gestores, certo é que estes tiveram culpas no cartório, caso contrário não teriam rolado cabeças. Quanto aos bancos, nada se sabe de concreto. No entanto, a abertura à renegociação e o desconto de 31% na resolução dos contratos, indiciam que algo não estava bem...

Ainda assim, falta resolver a questão Santander. Este banco foi contratado em 6 contratos, com o Metro de Lisboa, Metro do Porto, Carris e STCP, num valor total (de perdas potenciais) de 1.700 milhões de euros (a maior fatia no total dos contratos, e o remanescente face aos 3.000 milhões inicialmente anunciados).No entanto, e ao invés de outros contratos, estes não têm clausulas de exercício antecipado por parte do credor, pelo que não existe o risco de o Santander exigir a resolução antecipada dos contratos antes da maturidade, pelo que existe uma menor urgência na sua negociação.

Mais uma boa notícia é o facto de "O novo regime do Setor Empresarial do Estado, que deverá ir brevemente a Conselho de Ministros, prevê que todas as operações com derivados financeiros e financiamentos das empresas públicas tenha um parecer obrigatório do IGCP", o que aumenta a fiscalização sobre a gestão de risco das empresas públicas, reduzindo o moral hazard da utilização de contratos de risco.