Neste rectângulo no fim da
Europa, pacato e fadista, há uma tendência política que procura, à saciedade,
dar um arzinho de esta ser uma terra de anarquia e revolução. Para os poucos que
ainda não descobriram de qual tendência se trata, estou-me a referir à 3ª força que mais
faz barulho em Portugal: o sindicalismo (a seguir ao comentário futebolístico e ao politico na TV).
Veio isto a propósito das
incansavelmente repetidas greves no sector dos transportes, em particular, no
Metro de Lisboa.
Só para não irmos mais atrás, na
última semana, tivemos:- Greves na CP e na Carris ao trabalho extraordinário, de segunda a sexta-feira;
- Greve no Metro de Lisboa, terça-feira;
- Concentração de activistas do sector ferroviário e manifestação nacional de ferroviários, quinta-feira;
- Greve no Metro de Lisboa na sexta-feira, desconvocada à última hora.
Mas, calma! Antes que o pessoal perca
o hábito, estão já marcadas novas “jornadas de luta”:
- Continuação da greve ao trabalho extraordinário na CP e Carris, Março inteiro;
- Plenário e manifestação de trabalhadores da TST, 16 de Março;
- Greves no Metro de Lisboa, 16 e 18 de Março.
Gostava
de saber o que pensam os instigadores desta "fúria grevista" sobre os
“direitos inalienáveis” (como gostam eles de dizer)… dos utentes dos transportes públicos! É que, como dito
pelo Tribunal Arbitral que decretou serviços mínimos para as paralisações da
semana passada no Metro, e bem assinalado por Pedro Sousa Carvalho no Público, «quando o metro pára, está em causa a “liberdade de circulação das
pessoas, tanto considerando o direito de circulação em si mesmo, como
relacionando tal direito com o direito à saúde, o direito à educação ou o
direito ao trabalho em sentido amplo (já que o exercício destes direitos
depende da possibilidade de acesso a um determinado local)”».
Porque os trabalhadores do sector
dos transportes públicos gozam de privilégios, mais do que injustificados, insultuosos
para a maioria dos cidadãos trabalhadores neste país.
Até há não muito tempo, circulava
uma folha, essencialmente referente ao Metro de Lisboa, da qual constava:
- Secretária de administração: €3.753,59;
- Mestre serralheiro: €2.969,30;
- Maquinista de manobras: €2.785,17;
- Maquinista: €2.587,25;
- Fiscal: €2.020,66;
- Motorista: €1.939,09;
- Agente de tráfego: €1.642,41;
- Desenhador: €1.547,09;
- Auxiliar: €1.476,86;
- Maquinistas conduzem 3h/dia e recebem entre 317€ e 475€ para abrir e fechar as portas; recebem subsídio por km percorrido, mais 68€ se faltarem menos de 5h, ou 223€, se não faltarem todo o mês;
- Funcionários do Metro têm assistência médica gratuita ao domicílio e recebem o ordenado por inteiro nos dias de baixa;
- Todos os trabalhadores do Metro, ao serviço ou reformados, têm direito a transportes públicos gratuitos, bem como seus cônjuges, pais, filhos, enteados e irmãos;
- Funcionários do Metro, Carris e Transtejo reformam-se com pensão igual ao último ordenado.
A situação é tão mais absurda, porquanto
as reivindicações dos grevistas são coisas tão genéricas como a “defesa dos serviços
públicos”, da “qualidade dos serviços”, ou protestos contra os preços ou contra
as subconcessões.
Como se greves amiúde no sector “defendessem
os serviços públicos", os tempos de espera, a satisfação dos utentes (que
lhes interessa essa parte?), reduzissem os preços e impedissem decisões de
privatização.
Muito pelo contrário!
Muito pelo contrário!
Cada vez que o Metro não anda ou que
os autocarros da Carris não saem das garagens, não é o governo quem perde (já
que os seus membros não são, que conste, utilizadores de transporte público
urbano), mas sim os trabalhadores (que não têm capacidade de ter carro próprio,
por impossibilidade económica ou motora), os idosos, os inválidos, os
estudantes, etc..
Cada vez que a CP não viaja, a
companhia acumula prejuízos, a juntar aos muitos crónicos que traz de continuada
má gestão e de investimentos avultados nas infra-estruturas ferroviárias, o que
só acelera a sua falência, empurrando-a para a previsível venda a privados.
Cada vez que a TAP não voa, a transportadora
perde clientes, torna-se mais vulnerável perante a feroz concorrência internacional,
tem de encerrar rotas, acumula dívidas, que, na impossibilidade de serem pagas
por fundos públicos (impossibilidade jurídica – ordens da Comissão Europeia – e
financeira – onde está o dinheiro para arcar com aqueles milhões?), embaratecem
a empresa e, novamente, empurram-na mais rapidamente para privados estrangeiros.
E por aí fora.
Há, por isso, uma certa falta de
visão da parte dos sindicalistas (felizmente, nem todos: [1] e [2]), que convocam greves e manifestações a torto e
a direito, apenas por protagonismo político e interesse pessoal de “mostrar
trabalho”. Activistas que, não-raro, levam a vida nessas lides, enchendo os
discursos de frases feitas e reivindicações obtusas e desapropriadas.
PS: A propósito, comentando o referido artigo de Pedro Sousa Carvalho no Público, um sujeito escreveu com piada: «O espanto é que estão todas as semanas a fazer greve contra o patrão e quando se fala de mudar de patrão fazem nova greve para o manter. É o problema destas paixões doentias».
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