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"Quod non est in actis, non est in mundo" ("O que não está escrito, não existe")

quinta-feira, 11 de julho de 2013

A golpada intelectual

Em resposta ao golpe de teatro do "entra-e-sai" exibido na Barracada na semana passada, Cavaco respondeu com um golpe de Estado. Os partidos portam-se mal (já agora quando foi a última vez que se portaram bem?), o que faz o Presidente? Toma o poder basicamente.


Depois de ouvir uma catrefada de gente (partidos, sindicatos, confederações patronais e até o governador do BdP), o que concluiu Cavaco?
  1. Concluiu que este governo será incapaz de resolver qualquer problema que seja, porque é um governo instável e sem rumo coerente.
  2. Concluiu que é tão indispensável, como urgente, um acordo entre os três principais partidos para uma estratégia nacional a longo-prazo.
  3. Concluiu que com estas lideranças partidárias não vamos a lado nenhum, de tal maneira que propôs uma “personalidade de reconhecido prestígio" para liderar o diálogo entre partidos.
  4. Concluiu que não faz mal algum ter um governo a prazo durante um ano (“um governo de gestão”, como lhe chamou António Costa), sem se saber que governo será, até eleições antecipadas no início do pós-troika (Junho de 2014).
  5. Concluiu que eleições antes disso nem pensar, porque temos cá a troika. Diz ainda assim que "o atual governo se encontra na plenitude das suas funções".
Trocando tudo por miúdos (já agora, detesto esta expressão), o que o PR quer é um governo do tipo Mário Monti, de iniciativa semi-presidencial que leve para o poleiro tudo o que é partido interessado em governar.
Trocando ainda mais (seja lá pelo que for), Cavaco quer entrar para a história como o tipo que, no meio do caos político-económico, de lideranças sem categoria e que aparentemente não se dão bem (?), num país intervencionado e com uma Europa maneta, conseguiu promover um consenso alargado "de salvação nacional" para quando os senhores da troika derem à sola. Ou seja, salvem-lhe a pele, nunca o país!


Ficam muitas perguntas por responder:
  1. Até onde vai a "plenitude de funções" do actual governo, se ele tem um prazo de validade definido pelo próprio PR e se este quer lá outro?
  2. O que fará Cavaco se Passos não aceitar esta tenda e se demitir, continuará sem convocar eleições por causa da troika?
  3. Ou se, caso contrário, Passos Coelho aparecer em Belém com a remodelação do governo já acordada entre partidos, Cavaco não a aceita?
  4. O PS e Seguro, desde sempre interessados em sacudir a água do capote, que andaram a exigir que só querem acordos depois de eleições, como poderão aceitar a proposta de Cavaco?
  5. Que personalidade neste país tem "reconhecido prestígio" que seja consensual entre os partidos? Fala-se à saciedade em Silva Peneda do Conselho Económico e Social - mais um habilidoso da nossa praça.

Cá para mim, estes "consensos" nunca dão em coisa nenhuma. Mudar exige mexer com interesses instalados e poderosos. Poder-se-ia pensar que quanto maior a base de apoio do governo, maior o seu "poder negocial" para mexer com interesses. Mas, na realidade, o efeito é perverso: juntar PS, PSD e CDS no mesmo governo é tirar oposição ao mesmo, ou entregá-la a grupos anti-regime (como é o caso do PCP), e permitir que sejam os próprios interesses a governar o país. Conclusão: nada muda. Para além disso, acordos destes nunca são duradouros. E se estes agentes políticos não os conseguiram alcançar até hoje, porque os alcançarão no futuro?
Contudo, nunca percebi aquilo que verdadeiramente de facto separa as lideranças partidárias: até consta que Passos e Seguro são amigos próximos. A divergência é fantochada, mais nada.
Eu acreditava muito mais no governo remodelado na semana passada (“o governo do CDS”, como lhe chamou José Eduardo Martins) do que no dos últimos dois anos.
Passos é um tipo sem cabeça, Gaspar era um tipo sem mundo e Relvas era um tipo da máfia. Embora Portas seja um bailarino confesso, é muito mais capaz do que Passos, pelo que pôr o primeiro a governar o país me traria mais garantias.
Mas agora, Cavaco foi buscar esta solução pífia que vai acrescentar incerteza e instabilidade. Faz deste governo um fantoche, um executivo em gestão durante um ano, o que era tudo o que nós não precisávamos. Para além de que dá a possibilidade a grupos anti-democráticos de ganharem terreno, caso o PS aceite a brincadeira.
Uma golpada esperta neste regime.

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