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"Quod non est in actis, non est in mundo" ("O que não está escrito, não existe")

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Não há Marshall americano que ponha isto em ordem

Por sugestão do desespero europeu, começamo-nos a questionar: e porque não um novo plano Marshall para a Europa? Vou tentar explicar porque é impossível.

Países ao abrigo do plano

Em 1947, quando George Marshall decidiu lançar o programa, a Europa estava, stricto sensu, arruinada.
  1. A recuperação europeia passava necessariamente pela reconstrução de infraestruturas de comunicação, fábricas, e o restabelecimento da produção agrícola e industrial. Nesse momento, a economia privada não existia, o que tornava natural e óbvia a intervenção de dinheiros públicos ou externos que a re-erguessem.
  2. O século passado foi, largo espectro, marcado pela ideologia e a "guerra fria". Para os EUA, era imperativo evitar que as nações europeias fragilizadas ficassem à mercê da influência soviética. Importava acabar com as manifestações existentes contra os governos locais, que desbravavam caminho para o comunismo a ocidente. Só se faria isso com crescimento económico e emprego para todos.
  3. Noutra perspectiva, o investimento "estadunidense" nas nossas quintas serviu para criar na Europa uma "bolsa de consumidores" que hoje lhes dá jeito. O encalço dos actuais globalização e mercados capitalistas.
Não foi, longe disso, um investimento a fundo perdido.
Contribuições anuais do plano Marshall para a Europa
Dimensão do investimento em cada país

Hoje, as circunstâncias económico-políticas são substancialmente diferentes:
  1. Nos EUA perpassa uma crise orçamental e um défice externo acentuado (double deficits - ver abaixo).
  2. O modelo económico global tornou-se, desde há muito, o capitalismo e consumismo. Em toda a parte se nota a forte presença e influência de multinacionais (McDonald's ou Coca-Cola são eg), a maioria delas americanas.
  3. A própria China é hoje o expoente da maneira deturpada de olhar o mundo globalizado, praticando um dumping social sem limites, uma ganância desmedida. Rastos espalhados pelos norte-americanos.
  4. A acrescentar, outros países emergiram, o que possibilitou aos EUA diversificarem os seus mercados de consumidores.
  5. Por outro lado, agrada aos Estados-Unidos manter o seu dólar mais fraco que o euro, para que não percam a tal mina de ouro europeia para as exportações (ver abaixo). Ainda para mais, não foi pela força do Euro que o dólar deixou de ser a moeda-padrão para outras moedas mais fracas.
  6. A questão ideológica deixou de ser relevante. E mesmo nesse ponto, aquele que seria o país de "ameaça" vive sinais de auto-implosão e paralisia, nem se podendo considerar sequer o antagonismo do american life-style: a Rússia.
Evolução da taxa de câmbio Euro-Dólar (fonte)
Evidência do duplo défice americano (fonte: FRED FED)

Portanto, espremendo tudo: a UE tem de se concentrar em resolver as suas questões: mutualizar dívidas nacionais acima dos 60% do PIB, harmonizar políticas orçamentais e de investimento, união bancária e garantir um sistema de equilíbrio entre países centrais competitivos e periféricos pouco competitivos (liberalizar quotas de produção e pescas nos países do sul, por eg), e, já agora, gerir e fiscalizar a sério a aplicação dos subsídios europeus (e não o desbarato que temos hoje).
Tudo isto para não esperar que a sorte nos caia do céu e que outros resolvam problemas só nossos.